terça-feira, 17 de junho de 2008

Monomito


“O monomito (às vezes chamado de ‘Jornada do Herói’) é um conceito de jornada cíclica presente em mito, de acordo com o antropólogo Joseph Campbell”. Ele é dividido em três seções: Partida – o herói almeja sua jornada; Iniciação – as aventuras do herói ao longo do seu caminho; e Retorno – o herói volta para casa.

O Paradigma Disney está constituído por duas esferas de elementos: as classes de actantes e as funções narrativas. Os personagens têm objetivos claramente apresentados e suas ações são motivadas por compromissos de troca. Seguem uma série de etapas. O protagonista é sempre bom; o antagonista, sempre mau. Este é motivado por cobiça e orgulho e só reconhece maneiras destrutivas para acabar com aquele.

Déxter é um especialista em amostras de sangue e trabalha para o Departamento de Polícia de Miami. Na infância, é adotado por um policial que logo percebe sua tendência homicida. Para tentar canalizar sua estranha vontade de dissecar seres vivos, o policial tenta guiá-lo para algo que supõe ser mais construtivo. No que se refere ao protagonista sentir-se deslocado no começo da história, há uma ligação com o que é apresentado pelo Paradigma Disney. Seu pai pode ser o elemento que o fez tomar o rumo da mudança. Déxter torna-se um assassino serial, que mata aqueles que a polícia não consegue prender. Diferente do monomito, o protagonista da série é um homem bom, charmoso, educado, carismático e respeitado, mas só superficialmente. Seu trabalho, na verdade, serve para ocultar sua verdadeira ocupação: a de serial killer. A identidade dupla tem de ser escondida de todos. Isso faz com que ele viva um embate diário entre o bem e o mal. O que sai totalmente do conceito de monomito, no qual o “herói” tem a personalidade determinada e suas ações são quase sempre previsíveis. Se bem que, não se sabe se Déxter pode ser considerado herói. Ele é um personagem complexo cujo código moral e ações são justificáveis para alguns e totalmente imperdoáveis para outros. Sua identidade é confusa, não sendo nem mocinho, nem vilão, apenas protagonista.

Na série Life on Mars, não há vilão. Pelo menos não um que tenta acabar com o mocinho. O agente Sam Tyler está perseguindo um assassino, quando é atingido por um carro e fica inconsciente. Ao acordar, descobre que está no ano 1973 e que agora é um novo agente recentemente transferido para a mesma delegacia em que trabalhava. Sam encontra muita dificuldade para aceitar a nova situação. Ao investigar um assassinato, ele descobre que pode haver uma conexão com os eventos do “presente-futuro”. O protagonista já se vê em uma situação difícil logo no começo da história, encara um “desafio” sem que tenha tomado consentimento disso e não há nada que siga os padrões de monomito. Suas atitudes não podem ser previstas, ele é vítima de uma ação própria sem que qualquer “vilão” tenha premeditado uma algo conta ele. Além de não estar claro se realmente está vivendo nos anos 1973 ou se está em coma e todo o enredo é fruto de sua imaginação. A série focaliza nas diferenças culturais que separam o policial atual do policial dos anos 70, principalmente no que se refere às divergências de abordagem dos suspeitos: enquanto no século XXI, o policial deve preocupar-se com as conseqüências legais de suas ações, seus colegas do passado tinham menos restrições e mais liberdade para agir com os criminosos.

1968 - O Comportamento Daqueles que faziam das Artes um Meio de alcançar a Revolução


Na década de 60, os músicos brasileiros eram mais que artistas da indústria cultural. Eram formadores de opinião, defendiam causas, tinham ideologia, filosofia e censo crítico. E, claro, eram ótimos instrumentistas, compositores, poetas e intérpretes.

Em 1964, o Brasil encontrava-se no olho do furacão. O golpe rompeu a já frágil democracia brasileira. Culturalmente, o país fervilhava. Até 1968, intelectuais e movimentos de esquerda podiam agir tendo pequenos problemas com a censura. A intensa produção vinha das peças de teatro, das músicas de protesto, dos filmes e das artes plásticas. Em todas as áreas, a política fazia-se presente mantendo acesa, principalmente no campo das artes, a chama que levava à polêmica que opunha experimentalismo e inovação, alienação e ousadia.

A partir de 1967, os comportamentos foram extremados. No campo da música, os artistas manifestaram-se contra o autoritarismo e a desigualdade social, porém propondo a internacionalização da cultura e uma nova estética não restrita ao discurso político. Suscitar a cultura de massa era tão importante quanto entender a massa revolucionária.

Caetano Veloso foi uma figura inerente no cenário brasileiro da época. Suas experimentações, instrumentos inusitados e guitarras elétricas entusiasmaram naturalmente a “nova música”. As mentes estavam realmente piradas, não há dúvida. Surgia vontade de misturar tudo, de mesclar isso com aquilo, de devorar das mais diversas influências. As idéias de Oswald de Andrade estavam mais atuantes do que nunca. Antropofagia era a palavra da vez, a atitude da vez. Os nomes haviam sido substituídos. Ao invés de Oswald, Mário de Andrade ou Patrícia Rehder Galvão (Pagu); tinha-se Gilberto Gil, Torquato Neto, Gal Costa, Tom Zé, Caetano, Chico. Tudo era novo. Nada de violãozinho na mão brincando de João Gilberto e cantorias simples, nada de Bossa Nova, nada de Jovem Guarda. Ou melhor, um pouco de cada coisa, tudo misturado num acorde só. Com tudo isso, muitos se chocaram acostumados com o que era produzido no Brasil até então. Alguns dos jovens, que associavam o Rock and Roll ao imperialismo, não aceitaram sua introdução na Música Popular Brasileira.Manter um nível intelectual dentro de uma sociedade como a brasileira terminava por tornar-se elitista. Foram poucos os que conseguiram romper essa barreira e se tornar “cabeça” e popular ao mesmo tempo. Caetano estava um passo a frente. É dele que partem as sugestões, as loucuras que viriam a se caracterizar posteriormente nas mãos e vozes dos mais diversos artistas.

“Sobre a cabeça os aviões/ Sob os meus pés os caminhões/ Aponta contra os chapadões/ Meu nariz/ Eu organizo o movimento/ Eu oriento o carnaval/ Eu inauguro o monumento/ No planalto central do país...”. Essa música chamada Tropicália não poderia começar de outra maneira, afinal, no jogo de referências a que se propõe, o ponto de partida só poderia ser este. É importante dizer que essa canção, assim como Alegria, Alegria possui uma nostalgia inerente a ela e maior do que se pode enxergar em um primeiro momento. Trata-se de uma nostalgia que atinge perfeitamente até os que não viveram a época em que tais músicas foram lançadas. Elas, em especial, parecem conseguir recriar ou explicar um pouco do que acontecia no ano de 1968. E todo o clima. Elas não possuem todo o teor político e dramático de Geraldo Vandré, ainda que possuam seu próprio tom quanto posição política. Há uma leveza através de imagens e idéias lançadas, uma atrás da outra.

No teatro, os textos das peças eram um pretexto e apenas um elemento entre tantos outros mobilizados com a finalidade de desconcertar e incomodar, com o limite da violência, o público. “Você já matou seu Comunista hoje?” interrogavam os atores de Roda Viva dirigindo-se a qualquer um nas cadeiras. Havia excesso de deboche e ápices de violência.

Muitos desses intelectuais, exemplos de coragem e ousadia, foram exilados e só retornaram ao Brasil na década de 70 e 80. Mas não perderam o senso crítico e o espírito de atrevimento. Com exceção de Geraldo Vandré que, depois de ter sido preso e supostamente torturado na prisão – apesar de negar que tenha sido –, não gosta de falar no assunto de modo que prefere esquecer todo aquele ano.

Muito mais que fazer música, eles queriam mudar o mundo. Diferente de hoje. Infelizmente, toda essa ousadia tornou-se uma total falta de vergonha e respeito. É hipocrisia generalizar, mas é deprimente pensar que a música deixou de ser um canal para se fazer política ou uma das formas de buscar a revolução. Ela continua sendo um dos meios de exprimir a liberdade de expressão, mas chegou ao ápice da forma mais chula e baixa que se pode pensar.